quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Monte Roraima

Monte Roraima
O Monte Roraima é um enorme platô de 34 quilômetros quadrados, uma colossal montanha-mesa cravada na floresta amazônica, no Maciço Guianense, a 346 quilômetros de Boa Vista. Fica na fronteira tríplice entre Brasil, Venezuela e Guiana. Com 1,8 bilhão de anos, está entre as formações mais antigas da Terra. O Himalaia, os Alpes e os Andes, por exemplo, são cadeias montanhosas muito mais “jovens”. Por essa razão, o Roraima é chamado de monte-testemunho. É memória da longínqua era paleoproterozoica. O monte e os outros seis tepuis irmãos formaram-se por sedimentação de areia do mar – tepui é a palavra do idioma indígena pemon que designa “grande montanha”. É desconcertante identificar em várias rochas os desenhos que o mar faz na praia quando a maré desce, aqueles sulcos convexos, delgados e simétricos. Os ventos e as chuvas foram responsáveis pela composição final do traçado geográfico como vemos hoje
De todos os tepuis, o Monte Roraima é o mais alto e aquele envolto em mistérios e mitos. Foi descrito como “o eldorado” pelos primeiros aventureiros que chegaram ao cume, no século 19. Quando esteve no platô, em 1842, o explorador inglês Robert Hermann Schomburgk (1804-1865) coletou plantas pré-históricas e completamente desconhecidas na época, o que fez florescerem histórias prodigiosas. A hipótese de que dinossauros poderiam habitar áreas ainda inacessíveis do monte inspirou sir Arthur Conan Doyle (1859-1930), o criador do detetive Sherlock Holmes, a escrever o romance O Mundo Perdido. Mais recentemente, o Monte Roraima foi recriado em 3D pela Pixar na animação Up – Altas Aventuras. É o destino do velhinho Carl Fredericksen, que pilota sua casa suspensa por milhares de balões rumo ao Paraíso das Cachoeiras. O filme reproduz com formidável precisão cenários como o Salto Kupu-Meru e o Vale dos Cristais. As histórias fabulosas sobre a montanha vêm de tempos remotos. Muito antes da chegada dos primeiros europeus, os índios pemons já reverenciavam o “monte sagrado”, para eles uma espécie de Jardim do Éden, o lugar onde começou a vida e a espécie humana.
E cá estamos, no ponto mais alto do tepui, imobilizados diante dessa vastidão inabitada, 34 quilômetros quadrados onde o homem parece um intruso. E eis aqui uma diferença fundamental entre o Éden pemon e aquele do Gênesis: nunca ninguém se estabeleceu neste lugar. A natureza é rude demais. Primitiva demais. Território de espécies mais resistentes que a nossa. Sobre as rochas, liquens e musgos, os mais antigos seres vivos, compõem minúsculos abstracionismos kandinskyanos, numa desafiadora paleta de cores. Não há área cultivável nem árvores altas, apenas arbustos que dependem mais de água e luz do que de solo. O habitat também não é simpático aos animais. Além do diminuto sapo preto endêmico e de um grupo de borboletas-azuis, em cinco dias de expedição vimos de perto um colibri e, de relance, um falcão pintado e uma diglossa maior. Pássaros em busca de um ambiente para meditar, provavelmente exaustos da convivência com seus iguais. Em três ou quatro ocasiões, ouvimos um leve zumbido de insetos. E só.
“Em razão do próprio isolamento, o tepui tornou-se um repositório de espécies ancestrais, muitas das quais endêmicas”, diz o professor Vladimir de Souza, coordenador do curso de geologia da Universidade Federal de Roraima. “Não ocorreu intercâmbio com outros ecossistemas, de modo que está razoavelmente preservado seu extraordinário banco genético.” A Drosera roraimae, farta de tentáculos com bulbos espinhentos nas extremidades, como miúdos maxixes selvagens, é uma das plantas insetívoras típicas. Uma outra planta, a Stegolepis guianensis, quando molhada – e como chove por aqui... –, opera uma mágica encantadora. À distância, na contraluz, sua flor espetada parece um punhado de diamantes reluzentes. O maior arbusto endêmico é a Bonettia roraimae, uma quase-árvore de formosura rude. Suas folhas vermelhas são resistentes como um plástico duro. Muitas das espécies têm essa característica. Como as raízes não encontram profundidade, as folhas grossas são acumuladoras de água.

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